quinta-feira, 24 de maio de 2012

Ela não queria amar





Estava frio. Era um dia frio e nublado. Ela não gostava quando o dia ficava assim. Para ela, todo dia nublado era triste e melancólico. Aquele não seria um dia bom - ela pensou.
Seu telefone tocou. Era ele com um tom firme e sério:

- Alô?
- Alô, preciso te ver hoje. Nós precisamos conversar.
- Nossa... Bom dia, eu estou bem obrigada, e você, como está?
Ele odiava ironia. Ela deveria se lembrar.
- Estou bem. Te encontro as onze na “nossa” praça. Ttutututu – ele desligou sem esperar resposta.

Ela sentiu pelo tom de voz que algo não estava bem. Ela pensou que aquele não seria m dia ruim, seria um dia péssimo. Ela sentiu medo: “O que será que ele quer me falar? Se ele escolheu pra falar na nossa praça, não pode ser coisa ruim. Vivemos tantos momentos lindos lá. Não seria justo.”

Onze horas e dois minutos. Ela aproximava-se lentamente, observando. Ele estava sentado no banco impaciente. Batia o pé no chão nervoso e preocupado.

- Oi. – ela disse trêmula.
- Oi. Sente-se. – ele disse dando um beijo seco em seu rosto.
- E então. O que de tão importante você tem que me falar a ponto de me ligar às oito horas da manhã?
- Hã... Bem... Já faz algum tempo que o nosso relacionamento anda abalado...
- Como assim abalado? Até ontem estava tudo bem.
- Não. Não estava tudo bem. Você sempre acha que está tudo bem. Você fechou os olhos para não ver muita coisa. Você não quis ver que o nosso relacionamento já não está mais como antes.

Isso explica os sumiços injustificados aos domingos. Os atrasos nos encontros. O descaso com as angústias dela. A falta de interesse pelas suas conquistas

- Sim. Eu assumo. Eu real mente havia percebido o seu desânimo no nosso namoro. Mas por te amar tanto, eu fingia não notar.
- Pois é. E esse é um dos motivos pelo qual eu quero terminar. Você me deixa fazer o que quiser. Você não confia em mim, mas diz sim pra tudo com medo d’eu terminar. Eu me pergunto onde anda a sua personalidade. Cadê o seu pulso firme de namorada? Eu te amei muito, mas sinto que você não soube me amar.
- É claro que eu soube. É claro que eu sei. Eu sempre fiz tudo o que você quis. Eu sempre disse tudo o que você queria ouvir. Eu sempre deixei você livre pra fazer o que quiser.
- Realmente. Você me deixou livre demais. Livre feito um passarinho que voou e não quer mais voltar. Amar não é fazer tudo o que o outro quer muito menos dizer tudo o que o outro quer ouvir. Isso se chama submissão e se eu quisesse um cachorrinho, já teria comprado num pet shop não acha?
- Mas porque você não me disse isso antes? Porque você deixou chegar a esse ponto?
- Olha só você de novo. Eu não tinha que te dizer o que fazer. Você que tinha que perceber através das minhas reações as suas ações. Ou vai me dizer que você nunca percebeu?  Se você me amasse, você perceberia cada gesto meu e questionaria a minha cara brava, o meu olhar de censura, a minha fala séria, o meu jeito seco. Mas até isso você fingia não notar. O que me deixa triste é que no começo você não era assim. Suas amigas que fizeram a sua cabeça. Tudo o que elas diziam era “lei” e quem era eu pra competir? Eu não tinha o que fazer.
- Não. Espera. Você não precisa terminar. Ainda temos uma chance. Eu prometo que vou mudar.
- Não. Agora é tarde. Sabe aquela sua colega do trabalho? Então. Já faz um mês que estamos juntos. Eu estou gostando dela de verdade. Estou terminando com você pra pedir ela em namoro. A nossa história chegou ao fim e eu só quero que você saiba que a culpa é sua.

A surpresa que ela teve, fez ela engolir suas palavras. O silêncio e as lágrimas falavam por ela agora. Ela ficou quieta, absorta em seus pensamentos. Nem percebeu quando ele disse adeus  deixando uma carta ao seu lado. O replay na sua memória serviu para que ela reconhecesse sua culpa. Quando ela voltou em si, percebeu a carta ao seu lado e ainda chorando, abriu e começou a ler.


Minha menina...


Não chore. Sinto muito ter dito tudo isso. Sei que foi difícil digerir essas palavras. Mas aposto que antes de ler essa carta, você reconheceu que a culpa foi sua. Acertei? Imagino também que você tenha imaginado que eu não terminaria com você nessa praça, cenário de todos os momentos lindos que passamos juntos. Mas sim, terminei. Terminei aqui e no futuro você entenderá que o que eu fiz foi para o seu bem.
Você lembra da nossa primeira briga? Lembra que foi por causa daquela sua amiga de infância? Aliás, 90% das nossas brigas foram por causa de alguma amiga sua. Você sempre as amou mais que a mim. Na verdade, você sempre amou elas e nunca a mim. Você não acreditou na gente. Você nunca fez planos comigo. Já eu, me imaginava casando e tendo filhos com você. Posso dizer que você tentou e foi por isso e por te amar tanto que ficamos esses 10 meses juntos. Mas agora acabou. Acabou porque suas amigas não te deixavam pensar sozinha. Acabou porque dos dois, eu sempre amei  mais. Acabou porque os nossos sonhos não eram os mesmos. Acabou porque você foi imatura e não soube me amar.

Um beijo. Fica bem e até qualquer dia.



Depois de ler a carta, ela secou as lágrimas, levantou, pegou seu celular e discou um número.

- Alô? Oi amiga, tudo bem? Tenho novidades, estou solteira. Chama as meninas porque hoje eu quero ir pra balada. 


É claro que ela sabia amar.

Ela só não estava pronta para amar naquele momento. Ela tinha apenas 17 anos.


Alessandra Rocha

Um comentário:

  1. Nossa Alessandra, eu simplesmente amei, amei mesmo o seu texto! *-*

    ResponderExcluir