quinta-feira, 31 de março de 2016

Sobre sonhos e conselhos

Seattle, 20 de abril de 2010.

Hi, my little girl Bia!

Acabei de chegar toda molhada do Seattle Center, acredita? Eu não me contive de tanta felicidade com o dia que amanheceu ensolarado por aqui hoje e aproveitei pra me divertir na fonte musical do parque. Fica bem próximo do Space needle, aquele monumento que parece um disco voador, sabe?
A fonte é linda Bia, os jatos de água são sincronizados de acordo com o ritmo da música que toca. Você se apaixonaria se conhecesse.
Tem sido ótimo esses dias que tenho passado aqui. Aqui chove muito e quando não chove, o dia quase sempre é cinza e nublado. Sinto dó do sol, coitado! Dá pra ver o empenho que ele faz para os seus raios encontrarem lacunas por entre as nuvens negras e conseguir pelo menos dar um "oizinho" para os habitantes de Seattle (risos).
Você não seria feliz aqui de jeito nenhum. São dias cinzas e nostálgicos demais para o seu gosto. Quanto a mim, acho que certamente encontrei meu lugar no mundo. Cidade chuvosa e nublada, há poucas horas do meu país preferido (Canadá) e com toque nostálgico é o cenário perfeito para tantos livros que desejo escrever.
Engraçado que lembro muito de você aqui. Porque sei de quase tudo o que você não gosta, e aqui, tem muito desse "quase tudo" (risos). Com exceção do Frapuccino que estou tomando agora. Sei que você também ama essa delícia do Starbucks. E agradeça a Seatle pelas nossas bebidas queridas, pois descobri hoje que o primeiro Starbucks nasceu aqui, não é demais? :D

Pausa. Suspiro.

Penso se consegui te distrair um pouco contando coisas daqui.
A verdade é que estou preocupada com você minha Lilo. Queria estar aí para entender melhor o que está acontecendo. Parece que a distância me impede de ajudar.
Acho que essa carta será longa, então pare um pouco e faça uma bebida pra você e depois "me" leve para algum lugar mais tranquilo. Posso te abraçar com as minhas palavras, você sabe disso. Não há distância que supere o poder das palavras e nem o amor que pode conter em cada uma delas.

Ouça. Aliás, leia atentamente.
Vi que você tem muitas dúvidas. Você faz perguntas retóricas o tempo todo. Não sei se ajudaria muito eu responder a sua pergunta retórica "quando é que eu vou aprender?". Pra falar a verdade, essa pergunta eu mesma me faço todos os dias: "quando é que a Bia vai aprender?" (risos).
Bem, entendo que você ainda não superou o fim do seu relacionamento com o Léo, e te digo que é normal não saber lidar com o que "sobrou" de você. Você só precisa lembrar que ainda "existe" você. Não é o fim, certo? Mesmo que você esteja toda bagunçada, ainda há como encontrar seus pedaços perdidos. É difícil ser forte quando o coração sangra sem parar, mas você vai conseguir.
No entanto, você só conseguirá superar quando parar de se iludir.
Ainda não acredito que você voltou a "sair" com o Léo "sem compromisso" ?
Não me venha com historinha dizendo que é porque você sente saudade e blá blá blá. Essa saudade só vai aumentar mais a cada encontro, a cada toque ou a cada beijo. Ele não ESTÁ mais com VOCÊ. Ele só quer alguém pra distrair as noites em que ele não encontrar ninguém. ANOTE ISSO E APRENDA, OK?
Isso  é carência amiga, e te digo mais, é carência em nível HARD.
Você não merece migalhas, já conversamos sobre isso, lembra?
Você sabe que o Léo não te ama mais (me pergunto se algum dia ele amou). Então pra que insistir? É como as estrelas no céu, algumas já morreram há muito tempo e o que chega até nós já é o fantasma da sua luz.
Agora você vai se perguntar como eu sei que as estrelas morrem. Ah Bia, você sabe como eu sou, vi esses dias em um seriado no Netflix e achei que seria convincente comparar o seu amor com a luz fantasmagórica delas (risos). Se não te convenci pelo menos te preenchi com um novo conhecimento (mais risos).

Bem, pelo que li não é só o Léo que tem tirado seu sono, não é mesmo?
Você se formou em administração, demorou tanto tempo pra encontrar um emprego e agora não se sente feliz nessa profissão?
Amiga, isso é mais normal do que você imagina.
Veja o meu caso como exemplo. Desde a adolescência que eu sonho em ser psicóloga, professora ou escritora, e veja, fui parar na área de exatas sei-lá-eu o porquê!
A verdade é que nunca é tarde pra perseguir seus sonhos e aspirações. Não seja medrosa gêmula, busque o que faz seu coração sorrir. Eu te apoiarei.

Suspiro. Caneta batendo na mesa.

Bia, só não entendi uma coisa.
Desejo que me explique o mais breve possível, pois você disse algo que trouxe grande agonia ao meu coração.
Porque diz que sou culpada por suas dores? Quando virei vilã dos seus sentimentos? Não entendo como contribui para essa crise existencial.
Talvez você esteja me culpando por sempre dizer o que penso sobre suas ações. E você finalmente se deu conta de que não menti quando disse que o Léo terminou com você por não aguentar sua carência excessiva e seu ciúme extremo. É isso?
Desculpe-me por isso. Minha sinceridade em demasia é muito inconveniente. Eu sei.
O que posso dizer é que fiz uma nova descoberta. O seu namoro não acabou por sua culpa. Acabou porque não era amor. Se fosse amor, o Léo ainda estaria aí e além do mas, todas essas suas peculiaridades não fariam mais parte de você. Sabe por quê? Porque o amor cura. Sim! O amor cura e nos transforma em pessoas melhores. Lembra-se do nosso seriado favorito "Beauty and the Beast"? Então, o Vincent é um homem-fera que só adquiriu humanidade pelo amor que sentia pela Cat. Ele deixou de matar pessoas porque isso a machucava, ele lutou contra seu instinto. Vê? Não é bonito?
Quando o amor é verdadeiro somos transformados. Sempre.
Eu só preciso te lembrar que eu não tenho culpa. Meu papel é te mostrar o que eu vejo estando aqui do lado de fora, mas não possuo a verdade absoluta, não sei como é sentir do lado de dentro de você. Eu até queria, sabe? Para assim poder te dizer com exatidão que eu sei como você se sente, já que essa é uma das únicas vezes que não sou totalmente sincera com você (risos).

Gêmula, o papel do amigo é dizer a verdade quando ninguém mais nos diz. É ficar perto mesmo quando o outro quer te esganar. É amar apesar dos defeitos e por causa deles, já que são eles que faz de nós quem somos, não acha?

Bem, de resto, escrevo meu último conselho:
Compre um chocolate suflair e uma coca-cola e vai assistir o show do Ed Sheeran. Aproveite essa tristezinha e chore até ela passar. Ás vezes, as crises existenciais são chuvas de verão que vêm para amenizar a seca do nosso coração. Eu tenho essas crises existenciais quase sempre, e me faz um bem danado quando ela vai embora, mas antes preciso deixar que ela cumpra sua missão em mim. É depois da chuva que sai o arco-íris, né?
Bom, e se não quiser fazer nada do que aconselhei, tudo bem, eu entenderei. Você nunca me ouve mesmo! (Risos).

Cuide-se geminha.
Fique bem.
Eu estou com você. Ou você não reconhece mais a minha letra? (HAHAHA)

P.S: Obrigada por me escrever cartas em meio a era do whatsapp. Eu amo cartas. E amo mais ainda as suas!
Beijos.

Um comentário:

  1. Que texto incrível, tão perfeito que a cada assunto pude imaginar o que havia escrito na carta da Bia. Parabéns pelo seu talento!!!

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